domingo, 12 de abril de 2015

Páginas amarelas


Tudo começou na sala de espera. Aquele não parecia um dos lugares mais ideais para se flertar com alguém, mas estereótipos pouco importam nesses momentos. Encarei. De verdade. No começo, ele pareceu não notar. Ou era desligado de tudo ou estava fingindo que não era com ele. Ou não se interessou. Mas depois de um tempo, as coisas mudaram e nossos olhos se cruzaram algumas vezes. Parecia mais novo do que eu e se divertia com a nossa brincadeira de olhar-a-cada-30-segundos. Loirinho, pele clara, bochechas "fofas", meio arrumadinho no jeito de vestir. Lembrava muito o irmão de um cantor de quem eu era muito fã. Percebi isso assim que pus os olhos no garoto. Por sinal, mal consegui tirá-los depois.
Aquela incredulidade de que pudesse existir tamanha semelhança sumiu depois de um tempo e as antigas fantasias musicais se dissociaram do presente. Aquele era o garoto bonitinho da sala de espera. Polo preta. Rosto de criança. Que vontade de ir até lá. Bom, se eu não fui, ele foi. Passou diante de mim umas duas vezes andando para lá e para cá. Até que era alto, mais do que eu.
Certa vez, ri de alguma amenidade que me falaram. Ainda sorrindo olhei para ele. Força do hábito. Ele sorriu em resposta. Nossa, aquilo estava mesmo dando certo. Hum, sorriso de criança. Mas olha que houve vezes em que ele nem se parecia com uma, como quando fazia um exame sentado de costas para mim numa daquelas banquetas. Só o reconheci quando levantou. O fim da picada foi quando um homem gordo, em roupa social, chegou. Sentou-se ao lado do garoto e o abraçou. Deve ser o pai, pensei. Abraço, assim, com o braço no ombro? Eles deviam ter uma relação muito carinhosa. Carinhosa?! Essa não parecia a definição exata quando olhei e vi as pernas do garoto passadas por sobre as do pai. Aquilo era quase um colo, em plena sala de espera. Qual é! O garoto não é mais criança. Será que o homem ainda não tinha percebido isso? Ou eu que não percebi o contrário?
Sei é que, depois dessa, passei a não olhar tanto para aquele lado. Fiquei tão desligada que não percebi qual nome chamaram. Quando olhei, ele já entrava com o pai no consultório. Provavelmente não nos veríamos mais. Não ali na clínica. Dito e feito!

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